O ordenamento do território é uma das causas. A lentidão da Justiça e a crise económica também.
.
Não têm sido tempos fáceis para Rui Pereira. Depois das mortes na noite do Porto, da onda de assaltos a bombas de gasolina, da invasão de uma esquadra de polícia em Moscavide e da violência no bairro Seis de Maio, o titular da pasta da Administração Interna vê-se agora confrontado com mais um caso com ingredientes explosivos: clivagens étnicas e muitas armas de fogo num cenário de guetização às portas de Lisboa.
No bairro Quinta da Fonte, em Loures, os moradores envolveram-se sexta-feira num tiroteio que, nas palavras do líder do CDS-PP, Paulo Portas, fez “lembrar Beirute”.
A situação preocupa o Gabinete Coordenador de Segurança (GCS), o Governo não apresentou até agora qualquer medida em concreto e a estatégia para já adoptada - reforço do policiamento - está longe de ser suficiente.
É necessária “intervenção do poder político”, admite o general Leonel Pontes, coordenador do GCS.
O CDS vai pedir explicações ao ministro no Parlamento mas, enquanto espera pela ida a São Bento, Rui Pereira deixou um aviso aos prevaricadores e uma promessa aos portugueses: “Aos autores desses actos faço um sério aviso: tudo faremos para os identificar e leva-los à justiça”.
A polícia inundou o bairro, mas o clima de tensão continua no ar.
A presença da PSP não será a solução para os problemas dos bairros violentos da grande Lisboa.
“Isto [a violência] não vai parar. São os sinais de pequenas granadas de mão a estoirar até que haja uma grande explosão como a que aconteceu em Paris”, adverte Francisco Moita Flores.
Acontecimentos que mostram o lado mais negro de cidades que cresceram sem preocupação com o planeamento urbano e descurando políticas de integração social. Assim, estes acontecimentos não são propriamente uma novidade para Moita Flores. “São uma réplica, são manifestações que se vêm repetindo e que têm que ver com fenómenos de auto-exclusão e guetização que formam estas pequenas ilhas”, considera o presidente da Câmara Municipal de Santarém e criminologista. A solução passa pelo poder político.
O que deve, então, ser feito? “Não é possível programar Lisboa, Almada, Loures de forma isolada. É urgente reforçar os poderes intermédios entre Governo e autarquias e reconhecer a autonomia da metrópole”, considera Moita Flores.
Já André Freire, destaca o funcionamento da justiça como estando na base dos fenómenos violentos. “A justiça, ou porque leva muito tempo a produzir decisões ou porque não apura responsáveis, cria um sentimento de crise de autoridade do Estado.”
Um incentivo à criminalidade porque “o aparelho policial/judicial não é capaz ou tem dificuldade em punir”, acrescenta o investigador do Centro de Investigação e Estudos de Sociologia do ISCTE.
Quando se vivem tempos de crise, as “baixas condições são outra explicação para o fenómeno da criminalidade em geral.
.
Gonçalo Venâncio, no Diário Económico de 14.07.2008
.