domingo, agosto 27

Explosivos portugueses com controlo deficiente

Os explosivos são uma matéria de alto risco em Portugal. Os sistemas de controlo são insuficientes, não há mecanismos de rastreabilidade e a fiscalização no local de utilização é escassa. O resultado é um país onde é fácil aos explosivos - produzidos e comercializados, numa primeira instância, legalmente - passarem para o mercado paralelo.
A situação preocupa a Polícia Judiciária, que, na última década, teve mais de 150 processos só na região norte. Mas não só: industriais e autoridades policiais ouvidas pelo DN lembram que, numa altura em que o terrorismo está na ordem do dia, Portugal tem compromissos internacionais em matéria de segurança.
Foram várias as situações irregulares detectadas pelos inspectores da PJ que trabalham nesta matéria. Um dos problemas, referem, é o facto de haver um controlo meramente formal, só através de papéis. Por outro lado, a partir do momento em que é emitida a autorização pelas entidades competentes para compra e utilização de explosivos, presume-se que toda a mercadoria é explodida. O que nem sempre acontece, sendo fácil desviar sobras.
A lei estabelece ainda que o produto não explodido deve ser armazenado em paióis, mas os inspectores detectaram já situações contrárias, a denunciar que são necessários "mecanismos de controlo mais efectivos". Até porque, lembram, existem muitas pedreiras ilegais a funcionar e isso significa que há formas de obter explosivos, mesmo sem a licença para operar.
Há mudanças a fazer no campo da regulamentação de forma a permitir uma prevenção eficaz e prática de crimes relacionados com este domínio. "Temos explosivos com cada vez menos volume, mas maior poder destruidor. E a nossa responsabilidade não é só nacional, mas europeia", explicou ao DN fonte da PJ. Estima-se, por exemplo, que os atentados terroristas em Madrid, em Março de 2004, tenham sido levados a cabo com conjuntos de explosivos de 20 quilos.
Por isso, defende, é necessário um "mecanismo de controlo mais efectivo", para dificultar a "pessoas de má-fé" a sua aquisição, explicou a mesma fonte, que questiona a "facilidade com que se adquire explosivos em Portugal". É um factor preocupante "apreensões de tão grande quantidade". Esta é uma situação que, garante, deveria levar a uma mudança na filosofia da lei, para que os explosivos "deixem, numa perspectiva regulamentar de ser vistos como um composto normal e passem a ser tratados como qualquer outra matéria perigosa".
A reflexão dos inspectores da PJ sobre uma definição do quadro geral de falhas nesta matéria começou com um grande processo relacionado com explosivos em 2005. As investigações a montante, que levaram os inspectores a todos os agentes do sector envolvidos, permitiram detectar as lacunas existentes em termos de fiscalização. E perceber a atracção do mercado negro por estes produtos, que quadruplica de preço na rede paralela de distribuição.
E o problema é que, quando são apreendidos explosivos em situação clandestina não há forma de saber o percurso que efectuaram, nomeadamente onde foram produzidos. A rastreabilidade - ou seja, a existência de uma marca identificativa que permitisse seguir um explosivo desde produção à utilização - é a solução que responde à dificuldade sentida pelos inspectores da PJ: "Os explosivos não têm assinatura. Quando apreendemos mercadoria, olhamos para eles e não sabemos de onde vêm. É preciso criar uma identidade para os explosivos."
Uma solução também que, por parte da indústria, é exequível. José Carlos Góis, da Associação Portuguesa para Estudo de Engenharia de Explosivos, explica que "as empresas não têm actualmente qualquer problema técnico em introduzir um código identificativos". A solução não será válida para todos os produtos, mas trata-se, explica este professor da Universidade de Coimbra, de "adoptar o que já é praticado em países da Europa, como França ou Espanha".
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Elsa Costa e Silva
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