Entre banhistas, comerciantes e clientes dos restaurantes, todos têm presente os confrontos de há uma semana em pleno areal da praia do Tamariz, Estoril, entre dois grupos rivais – duas vítimas esfaqueadas e tiros disparados para o ar, por gangs rivais da Amadora e de Chelas.
E uma coisa parece certa: "O medo afastou muitos banhistas e clientes daqui. Isso é indiscutível. Vê-se menos pessoas na praia e, naturalmente, em todo o comércio aqui perto. E nós dependemos deles para viver, ainda mais sendo esta uma zona turística por natureza", lamentava ontem ao CM Miguel Lopes, responsável do restaurante Bolina, local onde vários jovens se esconderam atrás do balcão e debaixo das mesas depois de perseguidos por um grupo numeroso e armado com facas e pistolas.
Um episódio nunca antes visto naquela praia e que afastou clientes do comércio e banhistas do areal. No dia em que cerca de 30 elementos do Partido Nacional Renovador – sob vigilância de outros tantos polícias – se concentraram no Tamariz em protesto contra a criminalidade e falta de segurança (ver peça secundária), Miguel Lopes olhava para a sua esplanada despida de clientes, quando há uma semana estava repleta e com fila de espera. "Tínhamos uma clientela fidelizada, e desde então perdemos mais de 50 por cento dos clientes", lamenta. "Vê-se mais polícia na praia, sentimo-nos mais protegidos, mas fomos muito afectados com o que se passou", disse o responsável daquele estabelecimento de restauração, que revela não ser o único comerciante afectado. "O Tamariz está ferido. Isto é um ex libris da região e alguém tem de cuidar dele."
Ontem, também devido à concentração dos nacionalistas do PNR, toda a zona do Tamariz estava policiada com cerca de 30 agentes da PSP, da Polícia Marítima e da Polícia Municipal. As pessoas mostravam um misto de segurança e medo pelos incidentes do domingo passado. Muitas dizem temer que este policiamento de visibilidade se tenha devido ontem ao PNR e que desapareça nos próximos dias.
DISCURSO DIRECTO
"ESTOU SEMPRE COM UM OLHO ABERTO", Afonso Durão, 56 anos
"Cheguei a pensar não vir mais para o Tamariz, mas mudei de ideias quando ouvimos que o policiamento ia ser reforçado. Estou é sempre com um olho aberto e outro fechado."
"O QUE SE PASSA NÃO É EXCLUSIVO DO TAMARIZ", Maria Teresa, 63 anos
"O que se passa aqui também acontece em Carcavelos, Oeiras, não é exclusivo da praia do Tamariz. Este ano vê-se mais polícia e o que aconteceu surpreendeu-me bastante."
"UMA PRAIA TRANQUILA, MELHOR QUE NO BRASIL", Danilo Brito, 29 anos
"Esta é a única praia que frequento e nunca tive problemas. Venho sempre com a minha mulher e filha e é uma praia tranquila, nunca nos sentimos inseguros. É melhor que no Brasil. "
MAIS PROBLEMAS AO DOMINGO
O domingo é apontado por banhistas e comerciantes como o dia mais complicado no Tamariz, Estoril. Há mesmo quem opte por praias diferentes neste dia. "Praticamente cresci no Tamariz, já assisti a alguns problemas, mas o que se passou no domingo ultrapassou todos os limites. Agora, nem sempre venho para aqui, pois qualquer dia eu ou alguém da minha família leva com uma bala perdida", disse ontem ao CM um banhista, que pediu para manter o anonimato.
"SENTEM-SE IMPUNES"
Com 80 anos e frequentador da praia do Tamariz há 50, o sr. Machado já viu de tudo no areal. "Já perdi a conta ao número de assaltos e de agressões na praia. Só quem não quer é que não vê o que se passa aqui", diz ao CM este banhista, que alerta para a impunidade sentida pelos grupos de jovens. "Eles nunca agem sozinhos e fazem tudo com a maior das calmas. Passam, roubam e vão-se embora. A praia sempre teve problemas, mas nos últimos anos a situação agravou-se muito. Agora há tiros e facadas."
EXTREMA DIREITA EM PROTESTO
Trinta elementos nacionalistas do Partido Nacional Renovador – sempre vigiados de perto por outros tantos polícias mobilizados para a zona – concentraram-se ontem na praia do Tamariz para protestar contra a onda criminalidade e a falta de segurança que nos últimos tempos tem assolado a linha de Cascais e também de Sintra.
As fortes medidas de segurança dissuadiram quaisquer confrontos entre banhistas e membros do partido, apesar de alguns insultos vindos do areal dirigidos aos elementos ligados à Extrema-direita. "Vão-se embora, seus c..." Numa concentração silenciosa, a resposta foi dada aos jornalistas por Tomas Taylor, jovem de apenas 18 anos que aderiu há dois ao PNR. "Esta praia tem muita escumalha. Isto tem de parar. Nós viemos aqui e não insultámos ninguém."
José Pinto Coelho, líder do PNR, alertava para o facto de Portugal se estar a tornar num "paraíso para os criminosos e um inferno para os portugueses e para a polícia". "As pessoas não podem vir à praia e andar na rua com medo. Portugal está a ficar entregue a pessoas anti-sociais, com roubos nos comboios, agressões. Qualquer dia não podemos sair à rua sossegados", afirmou José Pinto Coelho.
CHELAS: AMIGOS DE MIGUEL
Alguns dos elementos envolvidos nos confrontos são oriundos de Chelas e pertencem ao grupo de amigos do futebolista Miguel, do Valência, também ele associado a tiroteios em discotecas.
CASCAIS: MAIS SEGURANÇA
No dia dos confrontos, António Capucho, autarca de Cascais, reclamou mais segurança na zona. No dia seguinte, reuniu-se com o ministro da Administração Interna, Rui Pereira.
LINHA: CRIMES NOS COMBOIOS
A Linha de Cascais tem sido palco, nas últimas semanas, de vários crimes, com especial incidência nos comboios que ligam o Cais do Sodré, em Lisboa, a Cascais.
Fonte: Correio da Manhã de 11.07.2010