domingo, outubro 28

COSTA ANDRADE: As reformas do Código Penal e do Código de Processo Penal têm "soluções arrepiantes" do ponto de vista constitucional

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As reformas do Código Penal (CP) e Código do Processo Penal (CPP) têm “soluções arrepiantes” do ponto de vista constitucional, afirmou ontem, em Coimbra, o penalista Costa Andrade.
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Segundo o mesmo especialista, os legisladores tinham todas as condições políticas para responder aos problemas da Justiça, mas deixaram-se condicionar “pelos crimes sexuais sobre menores”, influenciados pelos efeitos do caso Casa Pia.
Convidado a pronunciar-se sobre as novas leis penais pelo Tribunal da Relação de Coimbra, Costa Andrade respondeu a muitas dúvidas dos diversos agentes da Justiça, mas deixou outras tantas sem respostas, porque nem ele as conseguiu ainda encontrar.
Um dos casos está relacionado com a declaração de inconstitucionalidade da destruição das escutas telefónicas sem a possibilidade do arguido as consultar. O Tribunal Constitucional (TC) já proferiu dois acórdãos neste sentido – o segundo foi publicado ontem em Diário da República – e, ao terceiro, terá de ser requerida a generalização para a extinção da norma.
Há um terceiro pedido no TC, ao abrigo do processo Passerelle, a aguardar decisão, como o CM noticiou na segunda-feira. Se a tendência dos juízes conselheiros se mantiver, teme-se “uma avalanche de recursos, com consequências terríveis” para o edifício judicial, alertou o procurador-geral adjunto do Ministério Público, Euclides Dâmaso.
Isto porque existe uma alínea no novo CPP que admite um pedido de revisão de sentenças transitadas em julgado sempre que seja declarada a inconstitucionalidade com força obrigatória geral, “de norma menos favorável ao arguido, que tenha servido de fundamento à condenação”.
Para Costa Andrade, pode haver vários entendimentos sobre esta matéria. Como tal, as consequências são imprevisíveis nos processos em curso e nos julgados, onde as escutas foram usadas como meio de prova. “Antes do primeiro acórdão avisei os juízes conselheiros de que iam criar um problemão. Ai está ele!”, adiantou o penalista.
Para o professor catedrático, o novo CPP operou “uma mudança de paradigma” no processo penal, ao retirar autonomia ao Ministério Público e entregar o domínio acusatório ao juiz de instrução criminal. Neste momento, o essencial do processo “vai jogar-se no inquérito”. O que sobrar para o julgamento “será já pouco importante”.
A reforma penal criou também situações “arrepiantes”, como é o caso da imputação de crimes sexuais a pessoas colectivas. “Como é que pode imputar-se a violação de uma mulher a uma sociedade?”, questionou o professor.
No campo das escutas telefónicas e outros meios de prova, como o agente encoberto, Costa Andrade advoga que devem ser usadas com o máximo de contenção, por interferirem com a reserva da vida privada.
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Fonte: Correio da Manhã de 25.10.2007 (link)
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