Monday, June 23

Parecer da Sociedade Portuguesa de Matemática sobre as provas de aferição dos 1.º e 2.º ciclos

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As Provas de Aferição que hoje decorreram por todo o país constituíram, para muitos alunos, um primeiro contacto com um teste nacional, externo e normalizado. É bom que os jovens se habituem a ser testados com rigor pelo que sabem.
Infelizmente, no entanto, uma série de circunstâncias fazem com que estas provas fiquem aquém do necessário. Primeiramente, os resultados não têm efeito sobre as classificações dos alunos, ou têm-no apenas se os professores e as escolas o entenderem — por isso há sempre um factor de desinteresse associado às provas. Em segundo lugar, estes testes não têm sido construídos de forma comparável de ano para ano, pelo que não se sabe o que de facto representam os resultados globais em termos evolutivos. Não se sabe sequer o que representam as classificações obtidas pelos alunos. O ministério estabelece uma grelha de classificação, mas depois a transformação dos resultados de aplicação da grelha em classificações finais dos alunos tem sido feita com critérios que o ministério não divulga. Significa tudo isto que não se sabe de facto o que representam os resultados das provas.
Além destas limitações, as Provas de Aferição têm tido dois problemas. Em primeiro lugar, os enunciados contêm um número exagerado de questões demasiado elementares. Mesmo com estas questões, os resultados têm sido maus. Imagina-se que poderiam ser bastante piores se os enunciados fossem mais exigentes. Em segundo lugar, os enunciados têm pecado por um vício pedagógico: não se centram em questões relacionadas com os algoritmos e os conceitos básicos que os alunos deveriam dominar, mas sim em aplicações diversas, com questões em que a interpretação e a conjectura sobre os pressupostos assumem um papel excessivo.
Infelizmente, é a ultrapassada teoria da “aprendizagem em contexto” e do “ensino organizado em competências” que está a ser exageradamente aplicada, tal como está a ser exagerada a importância da “comunicação matemática”, em detrimento dos conteúdos curriculares precisos. Em comparação com o ano anterior, salienta-se como aspecto positivo o facto de as questões destas provas serem, em geral, mais directas e menos palavrosas. Algumas das questões afiguram-se bem concebidas e interessantes, como por exemplo os exercícios 11, 16 e 23 na prova do primeiro ciclo e os exercícios 6, 12, 19 e 21 na prova do segundo ciclo. No entanto, a SPM tem alguns reparos a fazer em ambas as provas. Em ambos os ciclos, há questões demasiado elementares para o nível de escolaridade dos alunos. Exemplos são a questão 18 da prova do primeiro ciclo e as questões 8 e 16 do segundo ciclo.
Nas provas do primeiro ciclo, as questões 8 e 22 não avaliam qualquer capacidade matemática. Apuram apenas a capacidade de comunicação dos alunos. Nas provas do segundo ciclo, a possibilidade de utilizar calculadora, embora apenas com os cálculos elementares, tira sentido a algumas questões, que deixam de exigir qualquer raciocínio matemático e reduzem-se a um mero carregar de teclas. O exemplo mais grave disto é a questão 11, mas tal ocorre também nas questões 2, 7 e 13.
Em síntese, os alunos não são testados devidamente na matéria que deveriam dominar.
Com o pretexto de inserir os conceitos e algoritmos em questões aplicadas, acaba por não se testar devidamente nem o domínio dos conceitos nem o domínio dos algoritmos. Um bom desempenho não parece equivalente ao domínio da matéria. Os professores que têm insistido com os seus alunos na importância do cálculo e do raciocínio não se sentem apoiados com esta prova.
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O Gabinete do Ensino Básico e Secundário da Sociedade Portuguesa de Matemática
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